Meu pai, falecido em 14.03.2019 aos 91 anos, era o Professor e Doutor Francisco Pedro Estrázulas Pereira de Souza. Graduado em Filosofia pela UFRGS, com pós-graduação em Psicologia pela Universidade de Lawrence, Kansas; Mestre em Administração Pública pela University of Southern California (USC); e Doutor em Administração pela UFRGS. Todos o conheciam como Professor Chico Pedro; ele preferia (e se divertia) em ser apresentado assim em ocasiões solenes. Uma espécie de PHD gaudério, natural de São Gabriel.

Nada me ensinou e tudo aprendi com ele

O pai sabia muito bem que as pessoas aprendem o que querem e não aquilo que os outros pretendem ensiná-las. As pessoas preferem descobrir por si mesmas, de maneira proativa, ao invés de passivamente seguir um caminho determinado por outros. O que ele fez comigo, seu primeiro filho? Ele tinha um estilo não-diretivo. Nunca me apontou um caminho, falando: “faça isso” ou “faça aquilo.” Ao invés disso, ele deixava livros no meu caminho; me presenteava livros no Natal e nos meus aniversários. Me deu muitos presentes, mas em cada ocasião havia também um livro, ou melhor: pelo menos um livro, se não dois ou três.

Conversávamos muito, sobre tudo. Aliás, o pai parecia entender de tudo: de futebol a filosofia, de hipnotismo a hotelaria, de cinema a cinestesia. O principal, nessas conversas, eram as perguntas que ele deixava no ar: deliberadamente sem resposta, me estimulando a pensar e buscar minha própria resposta. Era também uma espécie de Sócrates dos pampas.

Nós nunca brigamos; nem sequer discutíamos um contra o outro. Discutíamos o mundo, a situação social, política e econômica. Esbravejávamos, educadamente, contra a burrice geral, a incompetência dos políticos, a ignorância dos empresários, a incapacidade das pessoas em perceber aquilo que, para nós, parecia ser tão óbvio. Raríssimas vezes discordávamos um do outro. Em geral um dizia “mata!” e o outro “enforca!”

Ele era também um grande contador de histórias. Adorava contar “causos” gauchescos, mas também histórias verdadeiras, de qualquer cultura. Quando fazíamos uma pergunta, sobre qualquer assunto, muitas vezes a resposta vinha em forma de uma história, uma parábola ou uma piada ilustrando aquilo que ele queria dizer.

A conversa com o Chico era sempre estimulante. Não só para mim, para qualquer um que conversasse com ele, porque ele trazia ângulos novos que enriqueciam a discussão. Fazia perguntas provocantes e ficava em silêncio, dando espaço para que os outros pensassem. Aprofundava a análise revelando novas camadas, novas perspectivas. E as pessoas saíam da conversa ruminando o que havia sido dito e perguntado. Ele plantava sementes na cabeça das pessoas, que depois davam plantas e frutos, por vezes exóticos.

Nas nossas conversas intermináveis, aprendi tudo e aprendi a gostar daquilo que ele gostava: cinema, gastronomia, humor, viagens, e leitura.

Cinema

O pai era um cinéfilo assíduo como poucos. Ia ao cinema cinco ou seis vezes por semana, às vezes assistindo dois filmes no mesmo dia. Pegava a sessão das 8 no Guarani e a sessão das 10 no Imperial, que ficava do lado; ou no Cacique, a uma quadra de distância.

A mãe contava que eles passeavam pela Praça da Alfândega num sábado ou domingo de tarde e olhavam os cartazes na vitrine dos cinemas, que incluíam fotos de algumas cenas. Depois escolhiam qual filme ver, à noite.

Mais de uma vez aconteceu de eu perguntar ao pai: “o que está passando no Imperial?” Ele me respondia: “Os Profissionais, com o Lee Marvin e o Burt Lancaster.” E eu perguntava: “É um filme policial?” Ele respondia: “É um faroeste em que o Lee Marvin e o Burt Lancaster são contratados, com mais dois, para resgatar a Cláudia Cardinale, que foi raptada por uns bandidos mexicanos. O chefe é o Jack Palance. Eles resgatam ela, mas ela não quer ficar com eles, quer ficar com os bandidos. Eles levam ela à força e o Jack Palance vai atrás deles, para raptar ela de novo…” Eu: “Então vocês viram o filme? E a mãe, interrompendo: “Que nada. Isso tudo ele sabe só de ver os cartazes… Nós vamos ver o filme amanhã!”

Gastronomia

O pai gostava de comer boa comida. Podia ser em restaurantes chiques e caros, ou num boteco desconhecido. O importante era a comida ser bem feita. Com ele aprendi que havia o Guia Michelin; ele chegava a planejar viagens para comer em certos restaurantes e depois nos contava os pratos que haviam comido e o vinho que haviam tomado.

Em casa, ele não cozinhava nada além de um tradicional churrasco gaúcho. Mas teve uma deliciosa (para nós) fase de preparar sobremesas deliciosas para o almoço de domingo e/ou alguns jantares memoráveis. Fez várias vezes pêssegos flambados ao rum, que se tornaram sua especialidade.

Humor

O pai adorava fazer piadinhas, trocadilhos e jogos de palavras. Não perdia uma oportunidade, mesmo que a piada fosse sem graça (e muitas vezes era sem graça mesmo). Mas ele ria muito das próprias piadas e com isto nos divertia. A sua diversão era contagiante.  Ele também era fluente em ironia e sarcasmo, sempre com extrema elegância: não contava piadas chulas, nem escatológicas; nunca falava palavrões.

Viagens

O pai adorava viajar, tanto a Nova Iorque como a Nova Petrópolis. Estava sempre planejando a próxima viagem. Ele tinha o espírito irrequieto e preferia ir a algum lugar, nos fins de semana, ao invés de ficar em casa. Com um fusca, nos levou até Santiago do Chile, descendo os Andes por uma estrada ainda em construção. Também de fusca passamos pela enchente do Araranguá, rebocados por um caminhão; fomos à Caverna do Diabo, em Eldorado Paulista, e até o Rio de Janeiro.

Em 1968 passamos 60 dias na Europa de trem, fazendo um roteiro em “x” todo planejado por ele para estar no lugar certo no momento certo: carnaval em Nice, feira de brinquedos em Nuremberg, musical em Londres e por aí a fora. Em cada local, hotel reservado com antecedência, por carta ou telegrama, numa época em que não havia internet e nem DDI. Depois vieram muitas outras viagens pelo mundo inteiro: em família, só ele e a mãe, ou depois só ele e a Magali. As aventuras que ele viveu em cada viagem rendiam muitas histórias na volta e dariam para fazer o roteiro de uma série com várias temporadas.

Leitura

O pai lia muito e eu também aprendi com ele a valorizar os livros. Meu quarto na adolescência tinha duas paredes cobertas pelos livros deles (meu pai e minha mãe). Isso incluía as obras completas de Freud, a enciclopédia Larousse e os “Great Books,” uma coleção de 56 volumes com as maiores obras literárias da Humanidade, de Aristóteles a Shakespeare, passando por Dante, Platão, Balzac e a Odisséia de Homero. Eles ainda tinham centenas de livros de psicologia  e administração, bem como alguns romances. Havia livros que o pai tinha desde a sua adolescência e eu os devorei a partir dos 11 anos de idade: toda a coleção do Tarzan, as obras do Monteiro Lobato, de Charles Dickens e do Alexandre Dumas. Depois comecei a ler James Baldwin e James Bond. Lembro da mãe perguntando ao pai se eu já tinha idade, aos 13 anos, para ler a coleção do James Bond, com o que continha de sexo e violência; e o pai dizendo só: “deixa ele ler o que quiser.”

O sentido da vida

Ao conversarmos sobre coisas mais profundas, como filosofia e religião, ele respondia com perguntas inspiradas por Krishnamurti. “Pai qual é o propósito da vida?” E ele: “Por quê a vida precisa ter um propósito?” E ele me indicava, além de Krishnamurti, “O homem à procura de si mesmo,” de Rollo May, “O medo da liberdade,” de Erich Fromm; e “O homem em busca de sentido,” de Viktor Frankl. O pai nunca foi religioso, mas sempre foi muito espiritual. Gostava de conversar sobre a história das religiões, destacando que Cristo viveu na Índia e que o Cristianismo, o Judaísmo e o Islã tinham mais semelhanças do que diferenças.

Ao mesmo tempo, me mostrava com suas atitudes que o mais importante era curtir a vida, com seus pequenos prazeres, e contribuir com trabalho para fazer um mundo melhor. Aprendi que a vida é seu próprio sentido. O propósito da vida é viver.

Certa vez, numa viagem, eu estava na dúvida entre comprar alguma coisa que tinha visto numa vitrine. Nem lembro do que era, mas lembro do seu comentário: “um gosto vale um vintém.” Ou seja, vale a pena gastar algum dinheiro para ter ou fazer algo que você realmente gosta.

Por outro lado, o pai não valorizava o ter acima do fazer.  Ele claramente valorizava mais a vivencia do que o produto, como agora virou moda se falar em termos de marketing.  Ele gastava em viagens, que eram vivencias; e comprava muito pouco para si mesmo. Naquela nossa viagem à Europa em 1968, fizemos tudo parando em pensões e hotéis duas estrelas; comíamos em restaurantes baratos, de modo a gastar no máximo 20 dólares por dia por pessoa; e cada um de nós tinha o seu orçamento. Mas uma vez a cada quinze dias,  o pai declarava que teríamos um jantar por conta dele, fora do orçamento. Foi assim que jantamos no Simpson on the Strand, em Londres, embora nosso hotel só tivesse banheiros coletivos, no corredor. E jantamos uma vez no Lido de Paris, mas comemos em bistrôs baratinhos no resto da semana.

A vivencia que tivemos juntos, naquela viagem, tem valor incomensurável. Tudo aquilo que vivemos juntos, na viagem das nossas vidas, ninguém jamais poderá nos tirar. Fica a saudade e a gratidão. Aprendi a pescar, graças a ti. Pai, obrigado por tudo.

Probably not; but they may lead you to trying to find out what makes you different from them.

Millions of people, sadly, live robot-like lives today: they are barely aware of the world they live in; they are not in touch with their own feelings; their sensations (smell, touch, taste, hearing, vision) have been numbed; they have practically no sense of ethics or aesthetics; they do not know who they are and what they want.

These people have been reduced to their rational portion of themselves, and to a poor version of that. This rational dimension is not what makes us human, though for centuries some philosophers have touted that reason is what made us superior from animals, and therefore human. The mistake is to then completely disregard the emotional, spiritual (values) and physical dimensions. If we only value the rational dimension, we are reducing ourselves to being very inefficient robots.

In the past two hundred years or so, notably since the Industrial Revolution, mankind has been trying to turn humans into robots. Millions have been taken away from being in touch with Nature, and have been piled up into high-rise concrete buildings from which they descend to re-locate to work-stations where they execute repetitive meaningless tasks. They are already operating most of the time like robots, but with less efficiency; it’s only logical that these meaningless tasks should be executed by robots, who are much more efficient.

The issue then is: what will these millions of robot-like humans do with their lives? In other words: now that they are freed from working like slave-robots to earn their living, how will they survive? And if we move to a “minimum income” society where nobody has to work, what will people do with their time?

Yuval Harari suggested in an article for The Guardian that millions might turn to playing virtual reality video games, since “life is a game, anyway.” I beg to differ. The statement that “life is a game” encloses a value judgment in itself, but it is not necessarily true: it is just a belief. If you believe that life is just a game, then of course turning to video games might be a good way to waste your life, since that’s kind of what you’ve already been doing anyway.

But what if you believe that life is something else? That’s when life begins to get interesting. Seeking out the meaning of life could keep you quite busy for a while and it might be more fun than virtual reality. Plus, it might contribute more to the betterment of mankind and to all species of life in the universe, too.

IMG_4685

Creative leisure

Let’s imagine what life could be like in a hundred years, in 2117. Some people say that robots will take over the world by 2050, but I think that most of the time these kinds of forecasts are wrong because they see too many changes happening too early. It’s a kind of impatient wishful thinking. As a result, you have those ideas spread in the 1930’s that by the year 2000 we would all be going around in flying cars like Flash Gordon.

Currently, the forecasts that have been circulating describe millions of people becoming jobless and virtually obsolete, because robots have taken over what they do. As factories become robotized and more efficient, more jobs carried out by humans disappear. And as robots and automatic systems replace humans in services, again this makes human jobs disappear.

If you believe the media, who will broadcast anything that will make you afraid, since this will sell more than anything that is not frightening, jobs will disappear over night. People will suddenly find themselves at home, with nothing to do. Millions will be overcome by despair and commit suicide; others will turn against their neighbors and shoot lots of random people, before they commit suicide. Others will choose a fate worse than death: they will play virtual reality video games and withdraw completely from the real world. I’m kidding, but I’m only half kidding. Indeed, many people might become addicted to video gaming, just as today millions are addicted to drugs, to religion, or to their meaningless work.

The key is: if all you have to do is lie on the beach, what do you do when you’re there? You can choose…

IMG_5199

Is this the change we could not predict in 1972?

Social change happens a little more slowly than technological change. Changes in technology appear suddenly, like the launch of a new smart phone or a new application; the way people behave changes much more slowly, and social change happens unevenly affecting some people quickly and others not at all.

Most likely the way work is distributed will be something that will shift gradually, and the behavior of people will change even more slowly. It is not probable that millions of people will lose their jobs all of a sudden. Most likely, what will happen is that gradually our society will adjust by working shorter hours each and every day, rather than fewer days a week or stopping work completely.

Why? Because it is part of human nature to work and love, to quote Freud. When asked what constituted a healthy mental state, since he had written “The Psychopathology Of Everyday Life” stating that everybody is a neurotic, to a lesser or greater extent, Sig responded with: “love and work.” A healthy human being should be able to relate to other people, and should be able to make what is felt to be a valid contribution in terms of work.

Therefore, two hundred years later it will make sense that society organizes itself in such a way that people are able to do some loving and some working each and every day. Rather than working eight-hour shifts or more, society will drift towards working three or four hours every day. This makes more sense for the well-being of an individual, than working your assets off for two days out of seven and then feeling rather useless for five days of the week.

Of course, society will be more flexible and allow for all kinds of arrangements, depending on the nature of the tasks to be carried out. Perhaps there will be some people working very intensely for two or three days and then enjoying the rest of the week off.

The challenge will be to find ways to spend all that free time. If today you are busy (or trying to look busy) for forty hours a week (or more), it may seem daunting to imagine yourself busy for only fifteen hours. Will you be extremely bored during all that extra leisure time?

Boredom might not be as bad as it is sometimes described. Psychologists have pointed out that allowing your children to be bored is actually more healthy for their development, rather than filling up their agenda with too many things to do, and whenever they complain: “Dad/Mom, I’m bored…” you bend over backwards trying to find something for them to do. Boredom leads to reflection, something that humanity is in dire need of. Bored children start thinking about what they like and dislike, they start imagining stuff. This is what leads to invention, innovation, stories, values and drama.

It used to be that puritans would tell you that “the idle mind is the Devil’s playground.” That is because they believed in a narrow-minded world divided between good and bad, with no nuances or variety, in which working was good because it kept you from thinking about enjoying life in ways that were more difficult to control. Without realizing it, they were already trying to turn people into robots, working mindlessly with no consideration to their emotions, their values (which could never be challenged) or their physical dimension (“your body is the temple of God and you should only use it to worship Him, and never to enjoy the pleasures of the flesh, which are all sinful!”). Definitely no Snickers or soda pop.

The reality is that what makes us whole human beings is the fact that we have four equally important dimensions: rational, emotional, spiritual and physical. This is what sets us apart from robots. And to realize our full potential, we must acknowledge and develop equally these four dimensions. They are all good and none of them is “sinful.”

In 1972, Arthur C. Clarke gave a keynote presentation at an International Conference on General Systems and Cybernetics held in Porto Alegre, Brazil (which I attended as a student). He spoke about the evolution of technology, and how it affected society. He stated: “the only thing we can be sure of, is that change will continue to happen, increasingly faster.” At the end of his lecture, he spoke about forecasts and how it seems that whenever people try to describe what the future will be like, they are bound to miss some of the most important aspects of the future that they are trying to predict.

During his talk, he had described the world beyond the year 2001 and mentioned things like “communicating, rather than commuting,” which we now refer to as “working from home.” He had spoken about automating jobs in manufacturing and in services, and creating interfaces that would allow even illiterate people to operate computers, using images rather than writing. He described smart phones and a rudimentary version of the internet. He had emphasized how seeing the Earth from space had given mankind a notion of ecology and how important it was to look after our planet. And he had described commercial space travel, which we still have not seen implemented in 2017.

He finished his presentation with a provocative statement: “I wonder what it is about the future, that I am unable to predict today… Probably that is exactly the thing that will have the most impact on all of us!”

That question has been in my mind ever since then, and I have asked myself whether that “unpredictable change” might be actually that things will NOT continue to change faster and faster… That perhaps the unforeseen change is that mankind will slow down the pace of technological change and move towards inner change. Instead of exploring outer space, move towards exploring inner space, but not in terms of the inner workings of the human physical body, but rather exploring the inner workings of the human mind.

Perhaps we are living “the dawning of the Age of Aquarius,” as touted by the 1960’s hippie culture: an era of greater harmony and understanding, sympathy and trust abounding, and the mind’s true liberation. If we set aside the hippie hype, perhaps indeed the extensive automation of jobs that are just rational repetition, will give humankind an opportunity to stop and think: to reflect on what it means to be human and enjoy humanity at its fullest.

If we work part-time as the new norm, we can spend our spare time with our family and friends, ensuring that we can finally make the world a better place to live for everyone. We can do a better job of educating our children at home (schools might be an outdated concept), with a focus on values and emotions, along with the rational. I don’t think this will be some kind of utopia where everything is perfect, but simply a world in which we will have just a bit less hate and destruction, allowing us to do less work and more meaningful things.

Some people might choose to spend their free time playing virtual reality video games; that’s fine, it is still better than going to war or blowing yourself up and those around you, because you see no purpose in life. For many others, though, there will be lots of opportunities to travel, get to know more people and places, and to engage in making life more enjoyable for more human beings.

The key for this will be to allow yourself to stop and reflect. Allow yourself to feel bored. Discuss your boredom with others, reflect with friends and also with people you’ve never met before. There is no learning without reflection, and that is the biggest menace we face today: not having time to reflect and learn from the barrage of information with which we are continuously bombarded. We will need to step away from “screen addiction” as something used to constantly and passively consume content. Rather, we can use screens to communicate and bond with other people, and to set up face-to-face meetings in which we are not just face-to-face on video screens, but where we can touch each other and smell each other, where we can use all our human senses and not just vision and hearing.

No, it doesn’t mean meeting people to have sex with them, although that is not entirely out of the question. Friendships are formed by also shaking hands, hugging, kissing someone on the cheek.It just means that whenever we drop part of who we are (our five or six senses, our values, our emotions) and restrict ourselves to the rational, we are reducing ourselves to robots. The meaning of life is to enjoy life; and that means enjoying all the dimensions that make us who we are.

IMG_4849Globalisation is an economic phenomenon: the fact that it is now possible to communicate with clients all over the globe, advertising, taking orders and delivering goods and services.

It is a common mistake to think that globalisation will lead to forming a single culture, washing out the different cultures existing all over the world.

Culture is formed of layers, and as such it has been often compared to an onion. The outer layers are more visible and were described by Geert Hofstede as symbols, rituals and heroes. These outer layers are more easily changed and are more affected by globalisation. They include, for instance, clothing, eating habits and music.

The core of culture, lying at the center of the onion, is the set of unwritten values that determine whether a community/region/nation behaves in a certain way or another. This should not be confused with stated/espoused values, which belong in the outer layers. Edgar H. Schein called the core values “assumptions,” to highlight the difference between the underlying values and the overtly stated values. An example: France has the overtly stated values of “Liberté, Egalité, Fraternité” (Liberty, Equality, Fraternity); yet, research has shown that is a rather hierarchical society, compared to other countries like the US or The Netherlands. Equality, therefore, in France, is a stated value, but not an underlying value; the core value in France, regarding that aspect, is respect for authority.

The core values are very resistant to change; they change very slowly, if at all. They have remained almost the same for centuries in most countries.

Think of culture as a giant spinning onion, approximately of the same size as Planet Earth. The linear velocity of the Earth’s rotation, on the surface, is roughly 1,000 miles an hour; the linear velocity at the planet’s core is just 1 mile per hour. Similarly, culture changes much faster on the surface, than at its core.

People in Zambia and in Zanesville, Ohio, may use the same brand of smart phones, may drink Coke and wear jeans, but that does not mean that they have the same culture values. The superficial layers of culture may be moving towards a single culture, but the core differences are still there, pretty much intact.

Will culture change faster in the future? Will even the core be more affected by globalisation, because of the increasing penetration of the internet? Maybe.

People everywhere are now more exposed to the superficial aspects of culture. Americans now eat sushi and the Japanese eat hamburgers. However, the core values of each culture are determined by the way children are brought up, before they are ten years old. If this changes in such a way that suddenly kids are brought up the same way in Arkansas and in Afghanistan, then both cultures will become very similar, with similar core values. Until that happens, the way people interact at home, at work and in their communities in general, will continue to be quite different, influenced by very different core values. Globalisation will affect the surface of culture, but will have much less impact on the core values.

For more info, see my books on Amazon.

What is really going on at the essence of the universal health care discussion in the United States? How come the most powerful nation on Earth, by military and economic standards, is not able to provide health care to all its citizens? To find answers, we must look beyond the sickening party politics and the chaotic legislation that shapes American Health Care. Right now, the politicians are not even reading the legislation that they are either supporting or attacking, on both sides of the aisle; it’s just a competition about who wins the argument: Democrats or Republicans. The millions affected by all this have been set aside.

In essence, the issue should be simple: if everybody pays a little bit, everybody is entitled to a little bit of health care. That’s how it works everywhere on the planet, except in the US. The core discussion is then: how much does each person have to pay, and how much coverage does everybody get? Everybody gets coverage, but maybe not a first class suite on the best hospital in Houston to have plastic surgery on your ear lobes.

Behind all the rational analysis of the myriad of options available, it gets down to culture values and the emotions attached to them. It is not really much of a surprise that the culture on Earth with the highest score on Individualism, combined with a clear preference for Performance over Caring (as measured statistically by Hofstede’s culture value-dimensions), becomes polarized around an issue that, primarily, is about individuals chipping in for the collective.

The problem with culture values is that they are closely linked to strong emotions, since they originate in early childhood, when we all learn what is considered “right” and “wrong” in our families and communities. Anything that challenges those deeply seated values elicits a strong emotional reaction, in every culture.

So when somebody in America proposes something that appears to threaten individual freedom and responsibility, such as Universal Health Care (take care of each other, not just of yourself), Socialist public policies (the common good is more important than individuals), or gun control (the State interferes with the individual freedom to have weapons of choice), it’s only natural that people may get upset and emotional about these things: they appear to threaten their core values and that is something very difficult to cope with.

I once met a young American woman at an international event, just after Obamacare had begun implementation. When I asked her: “how’s it going in the States, now that you have Universal Health Care?” She gave me a five-minute angry speech about how it all sucked, for one big reason: she would now have to pay an additional $150 per month out of her hard-earned salary so that other people would be covered by health care.

In any other culture, this would not be considered a valid argument. Basically, everybody says: “Sure! That’s just how it is! It’s like taxes: you pay a bit from what you earn, so that everybody can have public services, like roads, police… and also health care.” In the US, however, the thinking is more like: “I need to take care of myself and everybody should be capable of taking care of themselves.” As Margaret Thatcher so pointedly summarized: “there is no such thing as ‘society;’ everyone should take care of themselves!”

Indeed, the value-dimension of Individualism versus Collectivism can be seen as an unconscious dilemma that every society needs to solve: do we go towards one side of this polarity or should we tend towards the opposite? The statistical research studies carried out by Hofstede revealed that a few cultures tend towards Individualism, while most others go in the opposite direction, towards Collectivism.

Still, even those countries with similar statistical scores as the US (such as the UK and Australia, recently praised by Ivanka’s Dad) all have Universal Health Care; they managed to find a way around the issue, despite their belief in meritocracy and in individual responsibility. After all, scoring high in Individualism does not preclude cooperation and solidarity. Teamwork and collaboration are possible in every culture, but they express themselves in different ways. In collectivistic cultures teamwork comes naturally, while taking individual responsibility requires extra effort. In America it is teamwork that requires the extra effort, especially if there is not a clear short-term goal to be achieved. Individual responsibility comes naturally, it is almost taken for granted as a given. Will the US ever find their path, to having UHC without feeling that it hurts some people’s core values?

Perhaps they might, if they are able to simplify the overall issue. Right now people are discussing too many details in terms of what kind of coverage are certain groups entitled to, depending on age group, whether they are Federal Employees or not (shockingly, congressmen have legislated in their own benefit, ensuring they themselves get coverage, while millions of others do not), depending on where they live and what kind of work they do. Maybe it would be easier if UHC were to be funded by a blanket 1-percentage point increase in income taxes, for instance, rather than by singling out a specific contribution to medical assistance. If it’s embedded in your overall taxes, people tend not to argue.

If taxes were broken down into the different items they are destined to fund, we would see a lot of arguments about certain topics that do not bring benefit to certain individuals. Should single adults with no kids pay for public schools? Should people who live in farms pay for funding of large urban centers’ infrastructure? If I never use public transport, why should I subsidize railroads? As soon as you single out a collective benefit (like UHC) you will get some people objecting: “I don’t need that, why should I pay for it?” Yet the building blocks of any society rely on finding a balance between individual interests and collective ones. Each culture finds its own balance; America is still trying to find it regarding UHC.

The puzzle will only be solved if people look at the overall forest, not at the trees (or groups of trees). Obamacare was a bit of a Frankestein monster, too complicated and difficult for everyone involved. The Republican alternative appears to be even worse, arguably. Perhaps Congress needs to scrap all of it, and come up with something simple, elegant and truly universal. If the Aussies did it, surely America can do it too: just forget about partisan squabbling for a minute and look at what needs to be done for the overall population.

Essa afirmação aparece de vez em quando nas conversas de botequim, quando se atribui a culpa dos nossos problemas culturais à colonização portuguesa. Dizem que, se não tivéssemos expulsado os holandeses na batalha de Guararapes de 1649, hoje o Brasil seria um “paraíso holandês” igualitário, onde todos andam de bicicleta, o aborto e a maconha são descriminalizados e existe pleno emprego.

A questão é bem mais complexa do que uma conversa de botequim; e merece ser aprofundada um pouco mais.

Para colocar as coisas em perspectiva, vale lembrar que as circunstâncias que levaram à revolta contra a invasão holandesa por volta de 1645 tinham menos de patriotismo e mais de interesse econômico, de parte a parte. Os holandeses haviam emprestado grandes quantias aos portugueses e brasileiros donos de plantações de cana e usinas de açúcar, a longo prazo e juros baixos. Quando quiseram cobrar as dívidas, que vinham sendo “roladas” por vários anos, os devedores decidiram pegar em armas e expulsar os invasores… Foi uma forma conveniente de deixar de pagar o que deviam, em nome de um patriotismo que até então não havia se manifestado.

A tulipa tem espinhos

Já o “paraíso holandês,” para muitos brasileiros, tem também o seu lado ruim. Como disse Leandro Karnal no Estadão: “a tulipa tem espinhos.”

É importante destacar que a Holanda não é um paraíso, como de resto nenhuma cultura é melhor do que outra. A avaliação que cada pessoa faz é dependente dos valores de cada um; aquilo que para alguns é positivo, pode ser muito negativo para outros. Existe ainda o aspecto de que “a grama do vizinho sempre parece mais verde.” Ao se queixar da própria cultura, muitos brasileiros olham para outros países, como os Estados Unidos ou a Holanda, e pensam: “seria melhor morar lá!” Os holandeses, por sua vez, em geral, têm grande admiração pelo Brasil e gostariam de mudar para lá. Adoram o povo e o clima brasileiros e costumam ter uma visão muito crítica do seu próprio país.

Comparada com o Brasil, a Holanda tem aspectos desagradáveis: as pessoas dizem as coisas “na lata,” a comunicação é direta. Aos olhos de muitas outras culturas, os holandeses são rudes e grosseiros, sem papas na língua. Eles se acham apenas francos e sinceros, mas quem vem de uma cultura mais afável pode se chocar com tamanha franqueza. Pessoalmente, como bom gaúcho, não tenho problema com isso; os gaúchos gozam de reputação semelhante entre as culturas regionais brasileiras. Mas entendo bem que, para muita gente, esse estilo direto parece até ofensivo.

Responsabilidade até demais

Os holandeses assumem muito a sua responsabilidade individual, o que é elogiável. Entretanto, isso chega ao ponto da falta de solidariedade em certas situações. Você pede ajuda e o holandês avalia a situação, analisando se ele tem alguma coisa a ver com aquilo, se o problema foi criado por alguma que você fez e não deveria ter feito. Ele não “compra” o seu problema automaticamente; e pode simplesmente dizer: “é, você tem um problema!” Ou seja: “você se meteu nessa enrascada, a responsabilidade é sua e não minha; não venha querer me meter num problema que você mesmo criou! Trate de resolver isso sozinho!”

Nós, brasileiros, muitas vezes “compramos” os problemas dos outros e saímos do nosso caminho para ajudar. Os holandeses podem até fazer isso, mas somente se sentirem pena de você. Ou seja, se na avaliação deles você é realmente uma vítima da situação, podem ajudar (e muito). Mas se eles avaliarem que a culpa é toda sua por se meter numa enrascada, por negligência ou desleixo, consideram que seria injusto recompensar a sua falta de responsabilidade. E podem deixar você “na mão,” considerando que você merece.

Qual é a pressa?

Outro aspecto que irrita quem vem de fora é a total falta de pressa que se vê em toda parte. O lado positivo disso é que o holandês parece calmo; mas isso faz com que o trânsito seja lento e o serviço nas lojas e restaurante também. Até nos restaurantes de “fast food” a “food” não tem nada de “fast.” Tenho certeza que o McDonald’s da Holanda é o mais devagar do mundo. O lema nacional parece ser: “qual é a pressa?” Os holandeses não têm pressa e não entendem a pressa dos outros, que sempre lhes parece um exagero. Você acha que isso não é um problema? Espere então até aquele momento em que você se atrasou para uma reunião importante e o trânsito não anda porque uma velhinha de bicicleta está bloqueando a passagem da fila de carros à sua frente; ou quando você quer jantar antes do cinema e o garçom leva 30 minutos só para trazer o cardápio… Na Holanda você precisa saber que os serviços levam mais tempo para acontecer. Só tem uma pessoa na sua frente na fila do caixa? Calma. Essa pessoa pode levar 10 minutos para ser atendida.

Respeito a todos, menos à autoridade

A Holanda é uma sociedade muito igualitária. Isso é muito bonito, mas significa também que, comparado com o Brasil, na Holanda não existe respeito à autoridade do chefe, do perito, dos mais velhos. Todas as pessoas devem ser ouvidas e respeitadas igualmente, sem privilégio nenhum para ninguém. Qualquer chefe pode ser contestado, em qualquer lugar, por alguém que tenha menos experiência, menos conhecimento ou menor posição hierárquica. Ser chefe é mais difícil do que em outras culturas; ser policial não significa que vão obedecer o que você diz (você tem que persuadir as pessoas a obedecerem); ser um especialista não lhe dá respeito automaticamente: a sua opinião tem o mesmo peso que a opinião de qualquer outra pessoa.

Tolerância ao mau desempenho

Os holandeses têm uma sociedade muito inclusiva, o que é admirável. Mas isso significa, também, que muitas vezes se tolera um desempenho abaixo do padrão que seria exigido em outras culturas. A ênfase no desempenho é menor e isso ajuda a atrasar os serviços (qual é a pressa?). Aquele funcionário que faz tudo mal feito e que seria demitido na primeira semana de trabalho, no Brasil ou nos EUA, na Holanda permanece no serviço, trabalhando mal, até eventualmente aprender a fazer as coisas razoavelmente bem; mesmo que isso demore três anos. O lado positivo é a inclusão. O lado negativo é que o desempenho é baixo e lento; como cliente, você sofre as consequências disso.

O paraíso não existe

A lista é enorme e daria para encher muitas páginas. Quero apenas destacar que o Brasil tem muitas coisas melhores do que a Holanda; temos algumas coisas a aprender com os holandeses, mas temos também coisas a ensinar. De longe, certas culturas parecem ser melhores, mas nenhuma cultura é melhor do que outra. O que cabe discutir é se existem alguns aspectos na nossa cultura brasileira que gostaríamos de melhorar. Podemos nos inspirar olhando para outras culturas; mas precisamos considerar também o lado negativo dessas outras sociedades. Precisamos escolher com cuidado o que imitar e o que deixar de lado, para não importar justamente aquilo que só vai nos prejudicar.

Para quem está pensando seriamente em mudar de país, para longe dos Lulas e Aécios, para onde não há nada a Temer, um conselho: examine bem a cultura do seu país de destino, antes de mudar. Procure conhecer os aspectos positivos e negativos, para não se arrepender. Mudar de país é como casamento: o seu noivo(a) não é uma pessoa perfeita. Olhe bem para os defeitos da pessoa amada (eles existem!). Se você consegue conviver com os defeitos, pode casar sem medo. Escolher outro país é a mesma coisa. Olhe bem antes de pular.

Muita gente atribui as mazelas da cultura brasileira à colonização portuguesa. Tudo o que não gostamos seria devido ao fato de termos sido colonizados por Portugal, que nos transmitiu valores detestáveis; dizem, ainda, os que assim pensam, que erramos ao expulsar os colonizadores holandeses do Nordeste, derrotando-os na Batalha de Guararapes em 1649. Se o Brasil tivesse sido colonizado pelos holandeses, seríamos hoje um país organizado, igualitário, tolerante e próspero; onde todos andam de bicicleta e a maconha foi descriminalizada, as prisões estão vazias, a educação é gratuita e de boa qualidade e o aborto é oferecido pelo SUS.

É claro que essas afirmações não podem jamais ser levadas a sério, pois os fatores históricos que influem na cultura são muitos, ao longo dos anos. Entretanto, me interessei por analisar um pouco mais a questão da cultura brasileira comparada com a cultura portuguesa, deixando as questões históricas e histéricas de lado, para debruçar-me sobre os estudos de Hofstede, um holandês, que mediu as dimensões de valores culturais desses três países, dentre muitos outros.

Somos parecidos com Portugal em quê?

Vejamos os escores de Brasil e Portugal nas cinco dimensões medidas por Hofstede, examinando uma de cada vez:

Distância de Poder (DIP): Brasil 69; Portugal 63. A diferença é muito pequena nessa dimensão, que mede se a cultura é hierárquica (“manda quem pode e obedece quem tem juízo”) ou igualitária. Se considera que qualquer diferença inferior a dez pontos na escala não é significativa o suficiente para ser considerada como tal. Os escores, portanto, dão um empate técnico nesse aspecto.

Entretanto, Portugal não foi a única influência na cultura brasileira em 500 anos; tivemos influências significativas da cultura nativa dos índios brasileiros, dos escravos africanos e das diferentes comunidades de imigrantes que aqui se estabeleceram, esses últimos a partir do Século 19.

Ocorre que a cultura africana é também hierárquica, assim como a indígena também é. Portanto, essas duas apenas reforçaram esse aspecto trazido pelos portugueses. Quanto aos imigrantes, dentre as principais correntes de imigrantes que vieram ao Brasil, apenas os alemães, holandeses e escandinavos trouxeram valores igualitários. Todos os demais, que vieram em maior número, tais como italianos, espanhóis, japoneses, turcos e sírio-libaneses, reforçaram também os aspectos de hierarquia. Não foram apenas os portugueses a influir nesse aspecto, tanto é que o escore é até um pouco mais elevado aqui, do que lá, em meio ao empate técnico.

Individualismo versus Coletivismo (IDV): Brasil 38; Portugal 27. Aqui a diferença é de 11 pontos e passa a ser significativa. Portugal é bem mais coletivista (“aos amigos, tudo; aos demais, os rigores da lei”) do que o Brasil, embora o Brasil continue sendo mais coletivista do que os EUA e a maioria dos países da Europa. Vale lembrar que Coletivismo descreve uma cultura na qual os grupos são mais importantes do que os indivíduos; a lealdade aos grupos é crucial; os grupos lutam entre si pelos interesses dos seus membros; e os relacionamentos são mais importantes do que as tarefas. É provável que o Coletivismo brasileiro tenha se tornado menos significativo do que o português, pela influência do individualismo europeu dos italianos, espanhóis, franceses, alemães, holandeses e escandinavos, além da influência mais recente de americanos e ingleses. Todas as demais etnias que compõem a população brasileira têm culturas Coletivistas.

Desempenho versus Qualidade de Vida (DES): Brasil 49; Portugal 31. A diferença é ainda mais pronunciada nesse aspecto, sendo que o Brasil está mais voltado para o desempenho do que Portugal, onde a qualidade de vida é priorizada. Nesse aspecto, a influência holandesa-escandinava vai no sentido oposto: todos esses países têm escores abaixo do de Portugal. Já todos os demais estão mais voltados para o desempenho, puxando o escore brasileiro para cima. No exterior o Brasil tem imagem de “país festeiro,” mas o escore dessa dimensão reforça uma imagem um pouco diferente: o Brasil é uma cultura onde se faz muito trabalho e muita festa, com intensidades comparáveis (work hard, play hard). O foco no desempenho é menor do que na Alemanha, EUA e Japão; e é comparável ao que se vê na Itália e França. Temos um certo equilíbrio entre trabalho e qualidade de vida, sem pender para um dos dois lados.

Controle da Incerteza (CDI): Brasil 76; Portugal 104. A diferença é bastante grande nesse aspecto, embora ambos Brasil e Portugal estejam no quarto mais alto da escala. Ocorre que Portugal tem o escore mais alto do mundo nessa dimensão, que é caracterizada por aspectos tais como: legislação extensa e detalhada; expressão das emoções; religiosidade e superstição; aversão ao risco e à ambiguidade. Todos esses aspectos são visíveis na cultura brasileira, mas eles são ainda mais evidentes na cultura portuguesa. Já que Portugal é o recordista mundial nessa dimensão, pode-se dizer que todas as outras etnias puxaram o escore para baixo, embora ele se mantenha superior ao que se vê no norte da Europa e nos EUA. A cultura portuguesa também é bastante formal e conservadora, o que pode estar ligado a essa dimensão. Por sua vez, o Brasil tem demonstrado que é mais conservador do que se pensava e isso se reflete na composição do Congresso Nacional.

Orientação de Longo Prazo (OLP): Brasil 65; Portugal 30. Essa é a maior diferença de todas. Ela significa, em essência, que a cultura portuguesa valoriza mais a disciplina em detrimento da flexibilidade; enquanto que no Brasil a flexibilidade é mais valorizada do que a disciplina e o cumprimento das normas. No Brasil, em função do combate à corrupção, boa parte da população tem se manifestado criticando este aspecto da nossa cultura; entretanto, não se pode culpar os portugueses por isso. É possível que nossa flexibilidade esteja mais associada às etnias indígenas e africanas. O fato é que essa flexibilidade, que nos ajuda em termos de criatividade e improvisação, por outro lado nos prejudica em termos de não cumprir normas e tolerar os pequenos atos de corrupção no dia-a-dia.

Resumo da ópera

A conclusão é que não somos tão parecidos assim com Portugal, exceto nos aspectos de hierarquia e coletivismo. Esses dois aspectos têm, como sempre, um lado positivo (ex: amizades) e um lado negativo (ex: corporativismo). Portugal nos deu coisas boas e más; não devemos só criticar aquilo que não apreciamos, sem reconhecer e agradecer por aquilo de que gostamos.

Nos demais aspectos, a culpa é de outras influências culturais.

A questão fundamental, entretanto, é outra: de que adianta ficar jogando culpa nos outros como desculpa para nossa cultura atual? Qual é a cultura que desejamos ter para nossos netos? O que precisamos fazer para mudar nossa cultura na direção desejada? Ao invés de culpar aqueles outros que influíram no passado para chegarmos aonde estamos, devemos assumir nossa responsabilidade pelo nosso futuro, que só depende de nós. Entendendo o nosso passado e o nosso presente, podemos fazer o nosso futuro desejado se tornar uma realidade.

Dilma falou bem, mas acho que não se deu conta da profundidade daquilo que estava dizendo.

Segundo o Estadão, Dilma declarou (10.12.2016) que o Brasil poderá ser vítima de “um golpe no golpe”.

“Eles subestimaram a crise econômica, acreditaram no que estavam dizendo, e muitos sabiam que era mentira, de que a crise econômica era responsabilidade exclusivamente minha”, disse a petista em discurso. “E também subestimaram os efeitos da crise política como fator de instabilidade, de aprofundamento de qualquer crise, e isso fica claro nos momentos em que  a crise política se transforma em crise institucional”.

A que ponto chegamos… A ex-Presidente da República fala em “golpe no golpe,” quando se trata de fazer o impeachment, por corrupção, de quem promoveu o impeachment dela, por improbidade de gestão. Ela chama de “golpe” a denúncia de corrupção. Ou seja, uma denúncia legítima é considerada “golpe.” Ela não se dá conta de que está dando razão aos seus críticos, quando chama tudo de “golpe,” pois está nivelando tudo por baixo. Está chamando de “golpe” qualquer movimento de destituir quem foi eleito, mesmo que o movimento seja totalmente legítimo, legal e ético. Isso não é “golpe de estado,” isso é a democracia institucional em ação, fazendo o melhor pelo País.

Ao dizer que a crise econômica não era exclusivamente responsabilidade sua, falou o óbvio. Qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento e consciência (reconheço que estou falando de 10% da população) sabe que a crise econômica brasileira não foi criada pela incompetência da Sra. Dilma Roussef. Ela é produto de anos de incompetência dos governos federais, estaduais e municipais que a antecederam. O pecado de Dilma é que ela não soube lidar com a crise. Ela fazia parte de um sistema incompetente e corrupto. Pode não ter se beneficiado pessoalmente com propinas, mas sabia de tudo e foi conivente, na melhor das hipóteses. Isso para não falar dos benefícios indiretos obtidos por quem ocupa posições de autoridade numa sociedade como a brasileira.

Disse que “subestimaram os efeitos da crise política como fator de instabilidade.” Ou seja: “vocês vão puxar o tapete para derrubar o PT, mas isso vai derrubar (quase) todo o sistema político brasileiro, ameaçando as instituições do País! Vocês vão se arrepender!”

Pessoalmente, não me arrependo.

Estamos enfrentando questões que são, não apenas suprapartidárias, são questões supra-ideológicas. Não se trata de PT versus PSDB e nem mesmo de direita versus esquerda. Estamos enfrentando a corrupção generalizada que abala todas as instituições brasileiras, do setor público ao privado. Isso afeta os três poderes, de Brasília a Botucatuva e afeta também nossas empresas, escolas e também nossas famílias. Estamos enfrentando o lado mais terrível dos valores básicos da nossa cultura, nossa maneira de ser e fazer.

E isso é muito bom, embora possa ser muito dolorido também. Estamos questionando a exploração do próximo, que encontramos no capitalismo e no comunismo igualmente. Isso vai além da ideologia, dos regimes políticos e dos partidos. Estamos falando de integridade e dignidade. E é muito bom que a gente se sinta indignado com o que estávamos vendo à nossa volta.

O primeiro passo para melhorar a situação é reconhecer que: como está, não pode continuar. É preciso reconhecer que existe um problema e que precisamos agir. Nós não inventamos a corrupção; mas todos convivemos com ela, durante anos, e fomos todos coniventes, em maior ou menor grau. É muito bom que tenhamos recuperado nossa capacidade de sentir indignação. Muitos de nós havíamos ficado “confortavelmente dormentes,” como disse Roger Waters, do Pink Floyd, no álbum The Wall.

Aceitamos a corrupção generalizada como fazendo parte da nossa cultura e concluímos que não havia forma de evita-la ou mesmo combate-la. Com isso, a situação foi se deteriorando cada vez mais.

Agora, com a Operação Lava-Jato e similares, estamos deixando de ser dormentes. É desconfortável, mas a dor é o sintoma que nos leva a procurar a cura.

Dilma, Cunha, Renan, Temer, Lula, Aécio e tantos outros, todos dirão: “não façam isso comigo! Eu vou denunciar aqueles que estão me acusando! Isso vai ameaçar a estabilidade das nossas instituições!”

Vai, sim. E é disso que precisamos.

Na Holanda, onde moro atualmente, se vê com frequência aquilo que quem vem de fora chama de “uma reforma holandesa.” Casas construídas em 1640 passam por uma reforma radical, na qual apenas a fachada, que faz parte de um patrimônio histórico tombado pela UNESCO, é preservada. Você vê uma obra dessas e enxerga, por uma janela aberta, que o interior da casa virou um enorme buraco e nada mais. Todas as paredes e pisos, o telhado, o chão, tudo foi removido e até as fundações estão sendo substituídas. Apenas a fachada se sustenta, graças a um conjunto de suportes de madeira e metal que a impedem de desmoronar. Terminada essa reforma, que pode durar dois ou três anos, sendo uma verdadeira reconstrução completa do prédio, a fachada continua dizendo “1640” em cima da porta principal; mas o interior é totalmente moderno, as fundações são novas, o encanamento e as instalações elétricas têm a melhor tecnologia do Século 21. A energia é solar e controlada por aplicativos inteligentes que você maneja com seu telefone celular. A fachada é uma lembrança histórica que denota respeito ao passado; mas o interior representa o que de melhor existe no presente para que se possa viver em conforto, de maneira sustentável, por várias décadas.

No Brasil, precisamos de uma “reforma holandesa” nas nossas instituições. Preservemos a fachada do Congresso Nacional e da Praça dos Três Poderes; mas façamos uma reconstrução completa por dentro, das fundações ao telhado. Reforma política, fiscal, trabalhista e previdenciária. Aproveitemos o embalo e façamos uma reforma igualmente profunda no nosso sistema educacional, começando pelo ensino básico. Vai levar tempo, talvez uma década ou mais. Por isso mesmo, precisamos começar já. Quanto mais cedo começarmos, mais cedo a reforma ficará pronta.

Fear is winning, sadly. Fear is driving the British out of the European Union: fear of change, fear of losing their autonomy, their identity, their sense of self. Fear is driving the US to choose T…

Source: The Triumph of Fear

Fear is winning, sadly.

Fear is driving the British out of the European Union: fear of change, fear of losing their autonomy, their identity, their sense of self.

Fear is driving the US to choose Trump as President: it is a similar fear as the one seen in the UK: fear of change, fear of losing their identity, their sense of self.

Fear drove the massacre at the Pulse nightclub in Orlando: the mad killer was afraid of gay people, he was afraid of being gay himself; fear of change, fear of losing his identity, his sense of self.

Fear drives the terrorists; fear drives the fascists who use the fight against terrorism to promote their own agenda. People are becoming afraid of life, afraid of change, afraid of the future. Out of fear, they want to flee to the past, a past that is no more and can never be again. A past when the UK was purely Anglo-Saxon, when the USA was predominantly Anglo-Saxon, when gender identity issues were hidden in the closet, away from public view. We cannot go back to the 19th Century, but people are so afraid of the future that they are clinging desperately to the illusion that we can return to that period.

Governments in Europe, in the US and in Latin America (actually, all over the world) have failed to address these fears; they have failed to educate people for managing change, they have failed to provide people with a sense of basic security and self-confidence, that would allow them to defeat such fears in themselves and in others.

In the past, “God and Country” provided the necessary feeling of security, identity, purpose, the sense of self. Today, Religion and Political Institutions are discredited: the people are sinking into fear.

We need to provide confidence in a future of integration, peace, freedom and security. For that, we must first address these fears and help people feel safe again, so that they can grow and embrace life.

Our future depends on it.

Em primeiro lugar é importante dizer que a corrupção existe em toda parte. Existe em todos os países do mundo, existe na Alemanha, Estados Unidos, em toda a Europa, no Brasil, no Paraguai, no mundo inteiro. Mas ela existe em maiores ou menores graus de intensidade, com maior ou menor frequência.

A diferença é que, no Brasil, a corrupção vem crescendo e se espalhando, vem se tornando banal. Precisamos inverter essa tendência, reduzindo a corrupção brasileira ao mínimo. Em outros países existe corrupção; mas ela acontece de forma mais discreta, mais sutil, com um certo recato. Se procura guardar as aparências: “não na frente das crianças…” No Brasil também era assim. Nós tínhamos um certo orgulho arrogante de sermos menos corruptos do que, por exemplo, o Paraguai. Ultimamente está difícil de se sentir superior nesse tipo de discussão.

O grande pecado do PT foi o de acabar com nossa esperança (ou ilusão?) de erradicar a corrupção na política brasileira. Ao invés de acabar com ela, o PT sucumbiu e se lambuzou, tanto ou mais do que os que ele criticava.

Pessoalmente, eu não desisti. Minha ideia continua sendo terminar com a corrupção.

Ou, se não é possível terminar com ela, pelo menos diminuir bastante a corrupção no Brasil. Sabendo que ela não vai terminar completamente, porque ela não termina completamente em lugar nenhum. Mas acredito que é possível reduzir bastante a sua incidência em relação ao que se vê hoje.

Se quisermos reduzir a corrupção significativamente, precisamos entender a corrupção. Não adianta lutar contra um inimigo que você não conhece, ou que você não entende. Quanto mais você entender sobre a corrupção, melhor você vai poder agir para acabar com ela, ou pelo menos para poder reduzi-la significativamente.

Pagando bem, fazemos qualquer coisa

Para entender a corrupção, vamos procurar descrever o que acontece na cabeça de quem corrompe, e na cabeça de quem é corrompido.

Normalmente é o empresário que faz o papel de corruptor. Ele se justifica dizendo que para obter uma concessão, ou para ganhar uma concorrência no serviço público, ele é obrigado a pagar uma propina a um funcionário. Isso é uma espécie de pedágio; se você não pagar esse pedágio, você não passa. Você não consegue sequer entrar na concorrência, ou que dirá ganhar a concorrência. É uma condição imposta pelo funcionário público, para que você possa pelo menos concorrer.

Eu já trabalhei com diferentes empreiteiras, e essa questão da corrupção algumas vezes foi levantada.

E se todas as empreiteiras se recusassem a pagar propina? Se todas as empreiteiras se derem as mãos e combinarem que ninguém vai pagar propina, se acaba com a propina nas obras do governo.

Um empreiteiro me disse: “é, esse pacto foi tentado já, duas ou três vezes; mas sempre aconteceu de que alguém acabava furando o mesmo e pagando a propina. E ao pagar a propina, ganhava a obra e deixava as outras na mão. Depois de duas ou três tentativas, as empreiteiras acabaram abandonando a ideia de terminar com a propina, não tem como.”

Essa é uma questão importante porque, afinal, em qualquer situação de corrupção tem que haver os dois: o corruptor e o corrompido, ou corrupto. Se os corruptores todos se negarem a pagar, não haverá mais corrupção.

E como é que fica esse processo, do ponto de vista do corrupto? Ele costuma dizer que ele detém um poder sobre um determinado serviço, assim como a prostituta tem poder sobre o seu próprio corpo, e decide se vai vendê-lo ou não. O funcionário público tem um poder sobre uma concessão, sobre a contratação de uma obra, sobre a decisão em relação a uma concorrência, e ele decide vender.

Eu já conversei com políticos que me deram essa justificativa: “Olha, é impossível a gente impedir que alguém faça isso, porque os valores são tão grandes que você não consegue convencer o sujeito de que ele deve continuar sendo honesto.” Eles alegam que quem começa o processo é o corruptor, que chega e diz assim: “olha, eu aqui ofereço para você cinco milhões de reais para colocar a minha proposta como vencedora nessa obra.”

Esse valor de cinco milhões de reais arruma a vida do sujeito. Ele não consegue resistir a essa tentação e coloca a culpa do processo na proposta que o corruptor faz. Agora, de novo, quem é que começou? Foi o funcionário público, ou foi o empresário? Foi o corrupto ou o corruptor?

Se for uma briga dentro de um jogo de futebol, cartão vermelho para os dois. Não interessa se foi um que xingou a mãe do outro, ou se foi o outro que provocou primeiro, expulsa os dois. O mesmo tratamento deveria ser dado então, na questão da corrupção. Na questão PT e o governo brasileiro, a justificativa muitas vezes é essa de que “os empresários é que corrompem, a gente não tem como segurar, mas a iniciativa é do empresário.” O empresário diz o oposto: “A iniciativa é do funcionário público.” Na verdade o que se precisa fazer é expulsar os dois, cartão vermelho para os dois.

A parte do PT neste latifúndio

Muito se falou sobre o aumento da corrupção no Brasil durante as gestões de Lula e Dilma na presidência. Será que aumentou mesmo a corrupção nesse período, ou o que vimos foi uma maior transparência, revelando o que sempre esteve lá, porém longe dos nossos olhos? Será que o Ministério Público Federal e a Polícia Federal passaram a agir com maior rigor durante a gestão Dilma, expondo aquilo que Lula, FHC e todos os outros presidentes anteriores, inclusive os militares, acobertavam?

É difícil avaliar, com isenção, se a corrupção se tornou maior por causa do PT ou se aumentou apesar dos esforços do PT em combate-la. A verdade simples é que não há estatísticas fidedignas à respeito; e a maioria dos ditos analistas políticos estão a soldo ou do PT ou de facções contrárias ao PT. Imparcialidade se tornou algo cada vez mais escasso no País.

Minha observação pessoal é de que a corrupção vem se alastrando e se intensificando no Brasil, gradativamente, desde o tempo dos governos militares do Movimento de 1964. Naquela época circulavam boatos de corrupção ligada ao Coronel Mário Andreazza, Ministro dos Transportes. Segundo esses boatos, as empreiteiras pagavam propinas para participar de obras de estradas. Falava-se, também, que a instituição do seguro obrigatório de veículos havia sido direcionada através de uma corretora de seguros de Novo Hamburgo, cujo sócio era parente do ministro.

Quero marcar apenas o ponto de que havia, sim, corrupção durante os governos militares. É possível que ela acontecesse em menor escala do que antes, mas sem dúvida existia.

Depois das “Diretas Já,” Fernando Collor de Mello se elegeu com uma plataforma de crítica aos políticos corruptos, que ele chamava de “marajás.” O que se viu, na prática, foi um nível de corrupção maior ainda do que aquilo que havia até então. Os empresários voltavam de Brasília chocados com a exigência de pagar propinas para Paulo César Farias se quisessem participar de qualquer licitação pública. A corrupção subiu de patamar.

No nível estadual, em São Paulo, Orestes Quércia elevou ainda mais o patamar da corrupção ao exigir 10% de propina sobre quaisquer licitações públicas. Os empresários comentavam, chocados, dois aspectos: (a) o percentual era mais alto do que nunca (se considerava até então que desviar 1% ou 2% de um grande contrato para os políticos e funcionários envolvidos era algo discreto, aceitável e fácil de disfarçar; desviar 10% era escancarar a corrupção, não havia como disfarçar); (b) a propina se tornava generalizada, incidia sobre todos os contratos públicos e isso não era mais falado em sigilo.

Na gestão FHC a corrupção era mais discreta. Não se falava abertamente a respeito. Entretanto, ela voltou a aumentar em valores e frequência quando se votou a emenda constitucional que permitiria a reeleição do Presidente. Nasceu naquela época a expressão “fisiologismo político”, pois os governistas compraram os votos necessários no Congresso e os políticos de diferentes partidos (e especialmente do PMDB) colocavam suas necessidades fisiológicas (dinheiro) acima da ideologia partidária, vendendo votos ao maior pagador.

A situação piorou, mais uma vez, no Governo Lula, porque a corrupção se institucionalizou através da criação do “mensalão.” Ao invés de cobrar propina por projeto, foi instituída a contribuição mensal de propinas dos empresários para os partidos do governo. Esse foi um marco importante na aceitação da corrupção como parte da cultura nacional; mas notem que o PT não criou isso do nada; isso foi uma etapa “natural” na evolução da corrupção no País. O PT não inventou a corrupção, mas tornou-a sistêmica, organizando e estruturando o processo. O PT também “socializou” a corrupção, distribuindo as propinas entre um maior número de participantes. Para garantir uma base de apoio mais ampla, o PT ampliou o número de beneficiários das propinas.

Dois outros fatores contribuíram para um aumento da corrupção nos governos do PT: (a) o partido adotou uma estratégia de aumentar significativamente o número de “cargos de confiança” na administração pública. Até então, milhares de cargos de chefia e direção eram ocupados por funcionários públicos de carreira; ao transformá-los em “cargos de confiança” eles passaram a ser ocupados por nomeações políticas, por pessoas vinculadas ao PT e que teriam uma passagem transitória por esses cargos. Isso criou uma cultura de “vou roubar o máximo possível enquanto puder, nesse pequeno tempo em que tenho acesso aos meios para obter propinas do setor privado!” (b) o PT designou para esses cargos de confiança pessoas despreparadas (mas leais ao partido). O despreparo visível dos incumbentes contribuiu para a cultura do “roubar enquanto posso,” pois já que não tinham preparo, certamente essas pessoas ficariam desempregadas quando outro partido subisse ao poder.

A ascensão de Dilma, por outro lado, representou uma força moralizadora. Embora ela fosse visivelmente incompetente para exercer a Presidência da República, ela era também visivelmente mais honesta do que Lula e todos os componentes da cúpula partidária. No seu primeiro ano de governo, Dilma exonerou vários ministros acusados de corrupção e endossou processos contra diversos funcionários acusados de crimes, mais do que qualquer outro Presidente. Parecia que, agora sim, a corrupção diminuiria, graças a uma gestão mais íntegra de Dilma.

O caldo entornou na campanha para as eleições de 2014. Disseminou-se ainda mais a compra de apoio político e de votos. Assim como a aparência de integridade de FHC havia caído quando da campanha para sua reeleição, agora a aparência de integridade de Dilma caía também, diante da necessidade de se reeleger a qualquer preço.

A corrupção foi tão grande e tão generalizada, que deu margem a manifestações públicas contrárias. Ao mesmo tempo, revelou-se a incompetência do PT na gestão de uma situação econômica mais difícil. Isso ocorreu não apenas no âmbito do Governo Federal, mas também nos governos estaduais e municipais, expondo um binômio “incompetência-corrupção” ligado ao PT.

É claro que isso existe também em relação a outros partidos; todavia, o PT mostrou-se incapaz, em 2014 nas campanhas políticas, e em 2015 nas gestões pós eleições, de administrar a economia e o quadro político para engajar as elites e o povo como um todo.

Diziam os romanos que “a mulher de César, além de ser honesta, precisa parecer honesta.” Dilma fracassou em parecer honesta, prejudicada pela deterioração da imagem geral do PT. Diante das acusações frequentes de corrupção, o PT reagiu muito mal, com um simples “sou, mas quem não é?” Em outras palavras: “corrupção, no Brasil, não é motivo para críticas ou impedimento de governar, pois a corrupção existe em todos os partidos e em toda a sociedade brasileira.”

Ora, essa afirmação, embora verdadeira, colocou a classe media diante de uma encruzilhada crucial: devemos aceitar a corrupção como parte inevitável da nossa cultura, ou devemos combate-la em todas as frentes, na política e no dia-a-dia? Pelo que se viu em 2015 e 2016, a maioria das pessoas optou pelo combate à corrupção. Mesmo com contradições e inconsistências, essa se tornou uma postura mais aceitável do que a alternativa proposta, que parecia ser: vamos aceitar a corrupção como parte inerente à nossa cultura, pois é impossível acabar com ela.

Colocar as coisas em termos absolutos, em termos de: “ou preto, ou branco,” é uma postura mais típica das culturas “de Competição,” como EUA e Inglaterra. É uma postura arriscada, pois as pessoas podem escolher justamente o oposto daquilo que o proponente pretendia. Se algum marqueteiro político, influenciado pelas práticas americanas, aconselhou o PT a respeito do assunto, acabou prejudicando ao invés de ajudar. Independente de preferencias político-partidárias, vejo a rejeição à corrupção como algo positivo para a sociedade brasileira. É preciso, contudo, que o combate à corrupção não se torne uma coisa seletiva, direcionada apenas contra certos segmentos sociais, ou partidários, poupando outros. Todos os corruptos e corruptores devem ser processados e punidos.

Evitando a volta para o futuro

Como é que se evita que a corrupção volte a crescer no futuro? Em primeiro lugar, precisa haver uma legislação efetivamente severa, que puna os implicados duramente, que demonstre que a consequência da corrupção ser descoberta seja tão negativa, que isso se torne um incentivo para que as pessoas não se envolvam nisso. Este é um aspecto importante, mas isso não é o suficiente.

Um outro aspecto é acabar com a situação que gera a corrupção, ou seja, se existem funcionários públicos que detêm um poder muito grande para decidir uma licitação, então é preciso acabar com esse poder concentrado.

É preciso haver normas sobre as licitações que sejam totalmente transparentes, de tal forma que não seja possível fraudar.

Sem dúvida a diminuição do tamanho do Estado, por si só, já diminui a tentação da corrupção e as oportunidades de corrupção. E é por isso que nos países que têm estruturas governamentais descentralizadas e onde o Estado tem um tamanho menor dentro da economia, nessas culturas existe menos corrupção; é simplesmente por isso.

Quando a cultura favorece a corrupção

Existem fatores culturais que favorecem a corrupção.

Que fatores são esses? Vejamos as cinco dimensões de valores culturais: a Distância de Poder (DIP), o Individualismo (IDV), a Orientação para o Desempenho (DES), o Controle da Incerteza (CDI) e a dimensão de Flexibilidade versus Disciplina (OLP). Diferentes culturas podem ter um score maior ou menor em cada uma dessas cinco dimensões; e esse score sendo maior ou menor, ele favorece mais a corrupção ou não.

Por exemplo: em termos de Distância de Poder, quanto maior ela for, quanto mais concentrado o poder, quanto maior o respeito à hierarquia, maior será também a corrupção e maior a transgressão (mais frequente). Numa sociedade em que existe grande respeito à hierarquia, significa que se respeita a figura da autoridade do outro, mas não a lei. Na ausência da figura da autoridade, quando o policial não está presente, eu me sinto à vontade para transgredir. Por quê? Porque o controle não está em mim; o controle está no outro. Eu vejo a necessidade de respeitar, não a lei, mas respeitar a hierarquia e a presença da figura de autoridade.

Nas sociedades de alta Distância de Poder, o poder está concentrado, e o poder concentrado é que acaba favorecendo a corrupção. Isso acontece porque a relação hierárquica entre as pessoas é considerada mais importante do que a lei em si. Se o meu chefe manda, eu faço; mesmo que seja contra a lei. A lei não se aplica aos poderosos, pois eles têm direito a privilégios que os colocam acima da lei.

O que acontece quando eu estou preso no engarrafamento e não vejo nenhum guarda por perto? Eu fico numa situação em que eu estou igual a todos os outros, mas o meu instinto hierárquico busca uma alternativa em que eu consiga ter mais poder do que os demais. Se eu sair pelo acostamento, vou chegar antes dos outros e mostrar que eu posso mais.

Individualismo ou Coletivismo?

A dimensão seguinte é a do Individualismo versus Coletivismo. No Individualismo, eu assumo responsabilidade individual e eu considero isso mais importante do que demonstrar fidelidade a um grupo, que é o Coletivismo.

Numa sociedade coletivista o que se quer não é o bem comum. O que se quer é o bem do meu grupo, e os outros grupos que se explodam. Então vem aquele famoso ditado “para os meus amigos, tudo; para os demais, os rigores da lei.” A lei só é aplicada para os outros, para os meus amigos não se aplica.

Se eu faço parte de um partido corrupto, eu denuncio as tentativas de processar a mim e aos meus amigos. Considero que essas tentativas são intrigas da oposição. Eles devem cumprir a lei, mas os meus amigos estão acima da lei.

A terceira dimensão é a questão de Orientação para Desempenho versus Orientação para Qualidade de Vida. Essa não é uma dimensão que tenha influência específica sobre a questão da corrupção e das transgressões, vamos deixar essa de lado.

Controle da Incerteza

A quarta dimensão, que é o Controle da Incerteza, tem influência no seguinte sentido: as sociedades que têm alto Controle da Incerteza costumam dar uma ênfase muito grande para a legislação. Elas acham que devem haver leis para tudo, como uma tentativa de acabar com a incerteza de não haver leis suficientes que esclareçam o que é certo ou errado. Ocorre que esses países não seguem essas leis. Fazer leis é uma coisa, obedecê-las é uma coisa diferente.

Se as leis que já existem não são cumpridas, fazer mais leis não vai mudar nada na situação. Isso é apenas uma forma de desviar a atenção do fato que existe impunidade. A impunidade ocorre porque não se cumprem as leis existentes e não porque é preciso mais leis.

A questão não se resolve com o comprimento da lei e sim com o cumprimento da lei.

Flexibilidade ou Disciplina?

O que muda a impunidade é aquilo que está vinculado à quinta e última dimensão, que é a Flexibilidade ou Disciplina. Quando o score é baixo existe disciplina. Nesse caso, a sociedade é normativista. As normas são consideradas absolutas, e a sociedade valoriza a obediência às normas e valoriza a autodisciplina: “eu obedeço a norma, mesmo quando não há um guarda por perto”; “eu obedeço a norma, mesmo que ela prejudique os meus amigos, ou a minha família”; “eu obedeço a norma porque eu assumo responsabilidade individual por obedecer a norma.”

Quando o score é alto, a sociedade considera que a aplicação da norma precisa ser cuidadosamente pensada em função da relatividade da situação específica. Deve-se prender quem passou o sinal vermelho? Depende, tudo é relativo. Depende de quem é essa pessoa que passou no sinal vermelho. É uma figura importante? Então talvez não se deva prendê-la, mas apenas adverti-la. É alguém que estava correndo de carro para socorrer outro que estava passando mal? Então isso tem que ser considerado.

Nas sociedades normativas o sujeito é multado independente do motivo pelo qual ele fez a transgressão. Nas sociedades relativistas e flexíveis, se examina a situação para definir se a norma deve ser aplicada ou não.

Quanto maior o score, mais flexibilidade, maior o relativismo. O problema é que esse relativismo acaba dando espaço para que se tolerem situações de transgressão, para que se tolerem situações de corrupção. Se acaba permitindo que essas coisas aconteçam, porque elas envolvem os meus amigos, porque elas envolvem uma pessoa importante, porque havia uma circunstância qualquer que justificava a transgressão, E começa a ficar mais difícil de discernir se a justificativa realmente era válida ou não.

Ocorre que o Brasil tem um score alto, um score que é quase o dobro do score da Alemanha, ou dos Estados Unidos, por exemplo. Isso significa que nós somos duas vezes mais flexíveis do que os alemães, ou os americanos, mas significa também que essa flexibilidade pode acabar servindo para endossar o jeitinho, para endossar a corrupção, para endossar a tolerância às transgressões de normas em todos os níveis.

O mecanismo é o mesmo, só varia de intensidade. O mecanismo está suportado por essa questão de relativismo, ao invés de normativismo; flexibilidade excessiva, ao invés de autodisciplina.

Como mudar

Como é que se resolve tudo isso, numa sociedade como a brasileira?

É preciso trabalhar na educação, e na educação não apenas no sentido de escolaridade, mas na formação de valores.

Uma cultura nacional se forma nos primeiros dez anos de vida. É nessa fase que as crianças aprendem a noção de certo e errado, do que que é considerado aceitável e o que não é aceitável. É nessa idade que se forma o que Freud chamou de superego, aquilo que Eric Berne chamou de ego parental, ou estado parental do ego, em termos de Análise Transacional. É nessa idade que se formam os valores e esses valores se formam em função da observação do comportamento dos adultos. A criança observa aquilo que os adultos fazem e ela age de acordo com aquilo que ela observa, muito mais do que por aquilo que os adultos dizem.

A criança aprende rapidamente que o que ela ouve não é tão importante, o importante é o que ela vê, o que ela enxerga, a maneira como os outros se comportam. E ela aprende isso primeiro em casa, ao observar a sua família, seus pais, os seus tios. Ela aprende com a comunidade à sua volta. Por último, ela vai aprender isso também na escola.

Tudo isso vai formando o caráter, os valores de uma criança, e os valores de uma comunidade e a cultura de um país como um todo. Se nós quisermos que o Brasil mude em relação à corrupção, nós precisamos começar a nos comportar de maneira diferente, diante dos nossos filhos e netos e sobrinhos, diante das nossas crianças. Nós precisamos ensinar esses valores de não-tolerância às transgressões, de maior igualdade, de maior responsabilidade individual, de maior cumprimento das leis. Nós precisamos ensinar isso através dos nossos atos, em casa, no bairro, na escola, em todas as situações.

Se nós conseguirmos fazer isso, daqui a vinte anos nós teremos uma cultura diferente. Não é uma coisa que se muda de uma hora para outra, mas também não é uma coisa que então se deva abandonar ou deixar de fazer. É preciso que se comece logo.

Dizem que alguém observou uma pessoa plantando uma árvore e o observador disse:” você está plantando essa árvore, mas vai levar vinte anos para essa árvore crescer, dar frutos e propiciar sombra.” A pessoa que estava plantando disse: “é por isso mesmo que eu resolvi plantar ela hoje e não esperar até amanhã”.

Mudar a cultura é um processo de longo prazo. Por isso, nós precisamos começar imediatamente. O quanto antes, melhor. Sabendo que alguns efeitos vão surgir em prazos mais curtos, mas não vai se ver diferença em menos de dois ou três anos, por exemplo. Esse é um processo que vai devagar, mas é um processo que é tão importante, que precisa começar imediatamente.